Prelude, 2024
16mm transferido para vídeo UHD
7'10'', Cor, Som (loop)
Som: Anjo Solidão (2021), de Gabriel Ferrandini; Um Ai (2019), de Maria Reis
Dimensões variáveis


«Pela primeira vez, Bilbao não está em contacto direto com a materialidade da imagem, mas relaciona-se sim com as representações virtuais de imagens artificialmente geradas. Como explica a artista, “O sistema DALL·E não tem fim; ele oferece sempre mais e mais variações da mesma imagem. Por isso, a imagem nunca está terminada; nunca encontra a sua conclusão. Ela é transformada por novas informações, ao mesmo tempo que produz novos dados. O algoritmo não tem um final à vista.”

“Eu estava obcecada em perceber se alcançaria um fim”, continua Bilbao, “procurando um momento em que a imagem chegaria a um ponto de saturação. Isso não aconteceu. Quando achei que tinha chegado a um possível fim, a figura com que estava a trabalhar transformou-se numa outra que parecia o Ronald McDonald, incluindo até o característico logotipo na camisa.” Participando naquilo a que a inteligência artificial chama de "aprendizagem profunda" (conceito usado pela primeira vez na pedagogia centrada no ser humano), o DALL·E recolhe referências do arquivo inesgotável da Internet ao mesmo tempo que aprende com os dados que os utilizadores introduzem. Assim, a busca da artista pelo limite da capacidade de criação da inteligência artificial não a conduziu a um vazio abstrato, como ela esperava, mas sim ao expoente do capitalismo: o logotipo com os Arcos Dourados da McDonald's, a tão conhecida rede multinacional estadunidensenorte-americana de fast food. A referência da figura é claramente Ronald McDonald, mas a semelhança é assustadora: as feições aparecem distorcidas, como se estivesse a derreter, e ela paira no vazio como um boneco semelhante a um palhaço. Talvez Bilbao tenha encontrado o fim, ou um possível fim, na forma de uma representação simbólica pós-apocalíptica do Capitaloceno.

“La mort” no final de Prelude articula um trocadilho com “L’art" (as imagens em movimento são o resultado da manipulação que Bilbao faz de uma cena do filme Pierrot le Fou, de Jean-Luc Godard, onde “la rt” é transformado em “la mort”) – a morte da arte, esclarece  a artista em conversa comigo, dada a criação da experiência estética mercantil pela inteligência artificial. No entanto, penso nas possibilidades artísticas post mortem produzidas pela IA. Há quase um século, Walter Benjamin expôs a célebre ausência de aura em imagens de reprodução mecânica, uma afirmação que tem sido incessantemente contestada pelos amantes e criadores de fotografia e da imagem em movimento. Até onde poderá, então, uma prática artística baseada na IA levar-nos esteticamente?

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O fim é apenas o prelúdio do que está por vir. A circularidade de Bilbao entra novamente em jogo. Trabalhando com o sistema DALL·E como co-criador, a artista projeta imagens de IA e filma a projeção com uma câmara de 16mm. Os movimentos rudimentares da câmara Bolex indicam a produção e reprodução mecânica das imagens de IA. Mesmo que a digitalização pareça desmaterializar a produção de imagens, a câmara analógica a que Bilbao recorre lembra-nos de como o digital está ligado ao mundo analógico: quilómetros de centros de dados e servidores tornam possível a aparente imaterialidade do reino visual digital.» (“Retratos de uma artista enquanto trabalha: Prelude (2024) de AnaMary Bilbao” Por Alejandra Rosenberg Navarro, Nov. de 2023; encontre o texto completo aqui)


COM O GENEROSO APOIO DE

Contemporânea

Fundação Calouste Gulbenkian


AGRADECIMENTOS

Celina Brás

Alejandra Rosenberg Navarro

Francisco Valente

Gabriel Ferrandini

Maria Reis

Mono No Aware

Carlos Almeida

Uriah Cassuto


* As imagens são vistas da exposição coletiva More-than-Human. Perspectives on Technology and Futurity., org. por Celina Brás (Contemporânea) na Galeria Avenida da Índia / Galerias Municipais - EGEAC, Fev.-Mar. 2024



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